sexta-feira, 7 de abril de 2017

LIVRE MERCADO E CÁRCERE DO PRECONCEITO



O mundo empresarial é um atrativo para inúmeros jovens ascender na carreira profissional. Muitos destes são oriundos de famílias de baixa renda, que favorecidos com os investimentos sociais e de educação de nível superior dos últimos anos alcançaram a formação acadêmica, a qual seus pais nem sequer almejavam, por terem sido criados num contexto político-social em que esse horizonte nem a eles eram apresentados. Com esses novos investimentos, oportunidades de desenvolvimento profissional se abriram no horizonte aos jovens das aŕeas periféricas, que se dedicam, entre uma rotina de trabalho e estudos a buscar uma colocação em grandes empresas, buscando também moldar sua postura e comportamento se adequando à cultura do ambiente empresarial. Entre esse grupo de jovens, há os negros. Aparentemente, dentro da lógica da doutrina neoliberal o mercado se rege pela livre concorrência, em que o mérito consiste pela qualificação e potencialidade do profissional em alcançar um cargo na empresa, sem passar pelo crivo criterioso de sua cor de pele e origem étnica. Ao menos na teoria esse é o ensinamento neoliberal.

Entretanto, BBC Brasil publicou no dia 30 de março de 2017 uma notícia em que o presidente da Bayer no Brasil denunciou, em seu perfil na rede social Linkedin, que um jovem conhecido por ele, de cor negra, com um excelente formação e currículo para assumir alto cargo empresarial foi rejeitado numa entrevista de trabalho numa grande empresa não por ter alguém mais gabaritado para assumir o cargo, mas por ser negro. O empresário que negou a entrevista e este jovem, sem cerimônia, chamou atenção do responsável pela equipe de RH, na presença do jovem que seria entrevistado que não contrata pessoas de cor negra e, era para ter ciência deste costume, pois, na empresa não tinha funcionários negros. Quando o jovem foi agradecer o presidente da Bayer pela indicação para tal empresa e relatou o ocorrido, este o aconselhou que fizesse uma denúncia. O que causou espanto no presidente da Bayer, foi o jovem se recusar a fazer a denúncia por medo de sofrer represália no mundo empresarial, não ser mais contratado em lugar algum, e perder anos de dedicação e formação para construir um vasto currículo, mesmo sendo oriundo de família de baixa renda.

Esse fato ilustra que a cor da pele é utilizada para  apreciação das características fundamentais da potencialidade, conduta moral e capacidade intelectual dos indivíduos, que pode ser um dos fatores para explicar um dos motivos de haver pouquíssimos negros assumindo os cargos mais altos nas grandes empresas. A aparência percebida pela quantidade de melanina na pele é ainda em muitos espaços sociais fator que pode abrir ou fechar as portas para inúmeros jovens com grandes potencialidades profissionais. Essa questão nas relações sociais em nosso país se torna um pavio que se pode acender em qualquer momento e, acirrar conflitos raciais, mesmo sendo um país com a população altamente miscigenada.

Diante de muitas ocorrências que manifestam conotações raciais, os mais diversos movimentos e associações que buscam ações afirmativas da valorização das pessoas negras na sociedade, que apresentam estudos sobre o racismo, a situação dos negros na sociedade e que buscam propor ações políticas para a defesa dessa grande parcela da sociedade brasileira. Uma das iniciativas mais debatidas e aprovadas pelo Estado brasileiro é a política de cotas para as pessoas declaradas negras nas universidades públicas e para cargos assumidos por meio de concursos ou processos seletivos públicos. Há um grupo que defende a política de cotas como fundamental para implantar a justiça social e minimizar o racismo no Brasil na esperança de um dia ser erradicado. Há quem defenda esta política como necessária no momento, mas não suficiente para minimizar os impactos das questões raciais pois, é uma política paliativa e se não houver outras mudanças estruturais na sociedade e na ação política, se tornará com tempo uma concessão de favor. Entretanto, há um grupo que diverge da política de cotas, analisando-a como atitude de acirramento dos conflitos raciais, e que também exporá a figura do negro como aparente pessoa humana inferior em relação ao branco.

Considerando as diferentes opiniões que se apresentam nos mais diversos espaços de debates a respeito da política de cotas, há uma ferida na sociedade brasileira, que são camufladas de muitos modos a respeito da discriminação da cor da pele, em que o juízo de valor e a capacidade intelectual se paute por uma análise de clarificação da cor da pele para a seleção de candidatos para concorrer aos postos mais altos no mercado de trabalho. E, se tratando de política de cotas, ela pode ter grande valor como apresenta seus defensores, entretanto, só sua execução não poderá modificar a construção do inconsciente coletivo de nosso povo. Será necessário implementações de políticas mais sólidas de formação de base, que levarão décadas ou mesmo séculos para produzir frutos mais amadurecidos na inconsciência da coletividade, para assim, os indivíduos trazer essa nova formação para a própria consciência a nova percepção da pessoa humana, sem se pautar pela valoração de cor de pele para realizar julgamento moral e intelectual.

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